Por Leonel González Postigo
Director de Capacitación, CEJA
A eleição do próximo procurador ou procuradora-geral da República implica em uma decisão de extrema importância para o sistema democrático brasileiro.
Quem for eleito ou eleita terá, sob sua responsabilidade, a gestão de uma instituição que desempenha um papel central contra a impunidade no Brasil.
Por essa razão, acreditamos ser necessário esclarecer as responsabilidades que deve cumprir a Procuradoria-Geral da República no marco de sua atuação na Justiça penal brasileira, especialmente após o transcurso de 30 anos da promulgação da Constituição de 1988, que regulou seu trabalho.
A PGR possui, como principal incumbência, promover o processo penal, quer dizer, fixar os critérios político-criminais que norteiam o trabalho de toda a instituição.
Isso implica confrontar seus princípios tradicionais de fiscal da lei e da obrigatoriedade, os quais foram abandonados em quase todos os países latino-americanos. O Ministério Público representa a parte acusadora no processo, e o faz no âmbito de uma política de seleção e/ou priorização do uso dos meios e recursos que dispõe, visto que não tem condições de investigar todos os casos que se apresentam.
Isso, por sua vez, permite que a PGR se concentre nos casos mais complexos e que corroem o sistema democrático, como os de lavagem de dinheiro, narcotráfico ou tráfico de pessoas, entre outros. Apenas dessa maneira os planos de luta contra a corrupção deixarão de ser declarações formais e se constituirão em decisões políticas concretas.
Um Ministério Público que atue com essa lógica facilitará a tão necessária aplicação do modelo acusatório de Justiça penal, previsto na Constituição e instrumentos internacionais, que no Brasil deixou de ser uma dívida histórica e se transformou em uma emergência nacional.
Por outro lado, consideramos necessário sustentar uma prática que se consolidou nas últimas décadas no Brasil: a escolha do candidato ou candidata que reúna mais votos na eleição interna realizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), por votação direta de todos os membros do Ministério Público Federal.
Essa é uma prática pouco comum nos países latino-americanos e que democratiza a seleção da autoridade da instituição.
No Centro de Estudos de Justiça das Américas (Ceja), desejamos que essas expectativas estejam bastante presentes no momento de se selecionar o candidato ou candidata para liderar a PGR.
Trata-se de um papel determinante para a efetiva realização de seus objetivos primordiais que, sem dúvida, contribuem para a transparência e o aprimoramento do sistema de Justiça penal.
A experiência na América Latina, como na Guatemala e na Argentina, tem demonstrado que procuradores-gerais comprometidos com esses valores conseguem transformar a instituição, desarticulando redes criminosas e reduzindo os conflitos sociais.
A decisão sobre o futuro ou a futura PGR constitui uma oportunidade histórica em nível local, bem como abre um precedente de grande importância em nível regional.
Em todos os países de nossa América Latina, o Ministério Público Federal ainda se depara com dois pontos de tensão: ser uma instituição que defenda abstratamente a legalidade ou se converter em um representante real dos interesses sociais e das vítimas.
É hora de o Brasil sair definitivamente desse debate histórico e se posicionar em defesa da população e de seus interesses.